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Como se ensina uma língua pluricêntrica?
Publicado por :Edleise Mendes
10/08/2022 21:57
O fato de o português ser
uma língua pluricêntrica significa o reconhecermos em toda a sua diversidade,
como língua de muito(a)s, não apenas no espaço dos países que o têm como língua
oficial, mas também incluindo a sua grande diáspora, além dos seus falantes
como língua não materna, cada vez em maior número. Isso implica que em cada espaço onde a língua
portuguesa se desenvolveu, a ela foram-se agregando novos elementos,
linguísticos e culturais, decorrentes das características geográficas, sociais
e culturais locais, bem como do contato com muitas outras línguas que com ela
convivem.
No século XXI, cada vez mais compreendemos a necessidade de abandonarmos o histórico de divisão e de isolamento que caracterizaram o desenvolvimento e as políticas do português ao longo do século XX, saindo de um sistema de referência bicêntrico, centrado nas normas de Portugal e do Brasil, sempre em regime de competição, para outro que valoriza a língua em uma perspectiva global, internacional e de gestão colaborativa e compartilhada por todos os Estados membros da CPLP. Essa nova perspectiva de compreensão e de gestão do português, já presente nos discursos e ações dos governos e nas reflexões e pesquisas dos especialistas da área, naturalmente tem influenciado os modos como a língua vem sendo ensinada. Mas será que estamos formando professores(as) capazes de atuar a favor da diversidade e da riqueza linguística e cultural de nossa língua, compreendendo-a em sua dimensão global e pluricêntrica?
Cada vez mais ouvimos relatos de situações em que
falantes de português têm sido discriminados no sistema escolar, da escola
básica ao nível superior, em diferentes países, especialmente em Portugal, por
não fazerem uso da norma linguística considerada “correta” ou padrão de
referência para as outras. O fato de as normas portuguesa e brasileira serem
consideradas centrais no sistema da língua portuguesa não significa que as
outras normas sejam versões “imperfeitas” do ideal de língua, ainda imaginado
por aqueles que se apegam nostalgicamente ao passado, desconsiderando o papel
relevante dessa língua no tempo presente. Assim, ensinar hoje o português em uma
perspectiva pluricêntrica não significa fazer uma bricolagem de normas ou de
aspectos linguísticos e culturais, uma vez que ensinamos e aprendemos a partir
do nosso contexto de vivência e da nossa própria identidade na língua. O que os(as)
professores(as) precisam é compreender o papel do português hoje no mundo, o
seu potencial de crescimento e seus novos posicionamentos na geopolítica global. Além disso, sentirem-se impotentes por não
conhecer todas as variedades do português é um modo mais cômodo de justificar a
discriminação pelo desconhecimento da diversidade da língua. Por isso, mais
vale uma atitude de abertura e o esforço cotidiano de valorizar outros modos de
se viver em português, com bom senso e empatia. A melhor forma de aprendizagem
é a abertura ao outro e ao que ele/ela traz de novo. Aprendamos, pois, com a
diferença – esse é o primeiro passo!